2011-07-25

contigo, Noruega





mataram na Noruega.

mataram jovens na Noruega.

perante o horror choramos os que são os nossos mortos.

contra o terror que nos quer destruir o mundo livre, gritamos com Munch.

e gritamos com Ibsen


a liberdade é a mais nobre e a principal condição da vida

2011-07-19

ler poesia mário cesariny



Afinal o que importa não é a literatura
nem a crítica de arte nem a câmara escura

Afinal o que importa não é bem o negócio
nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio

Afinal o que importa não é ser novo e galante
- ele há tanta maneira de compor uma estante!

Afinal o que importa é não ter medo: fechar os olhos frente ao precipício
e cair verticalmente no vício

Não é verdade, rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parola

Que afinal o que importa não é haver gente com fome
porque assim como assim ainda há muita gente que come

Que afinal o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente:
Gerente! Este leite está azedo!

Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do peludo
à saída da pastelaria, e lá fora - ah, lá fora! - rir de tudo

No riso admirável de quem sabe e gosta
ter lavados e muitos dentes brancos à mostra


Mário Cesariny
1923-2006

Nobilíssima Visão
Mário Cesariny
Assírio & Alvim

Nome maior do surrealismo português, Cesariny é poeta e pintor que merece ser conhecido. Na Biblioteca podem ser consultados alguns dos seus livros e antologias que o transcrevem. Mas para quem tem pressa de o conhecer vá já a este blogue ou passe pelas tormentas ou então explore a página da Wikipédia ou veja as obras pertencentes ao Centro de Arte Moderna da Fundação Gulbenkian (CAMJAP) . Já o demos a ouvir e a ele voltaremos.

2011-07-14

dizer poesia: Jorge de Sena



Uma pequenina luz bruxuleante
não na distância brilhando no extremo da estrada
aqui no meio de nós e a multidão em volta
une toute petite lumière
just a little light
una picolla... em todas as línguas do mundo
uma pequena luz bruxuleante
brilhando incerta mas brilhando
aqui no meio de nós
entre o bafo quente da multidão
a ventania dos cerros e a brisa dos mares
e o sopro azedo dos que a não vêem
só a adivinham e raivosamente assopram.
Uma pequena luz
que vacila exacta
que bruxuleia firme
que não ilumina apenas brilha.
Chamaram-lhe voz ouviram-na e é muda.
Muda como a exactidão como a firmeza
como a justiça.
Brilhando indeflectível.
Silenciosa não crepita
não consome não custa dinheiro.
Não é ela que custa dinheiro.
Não aquece também os que de frio se juntam.
Não ilumina também os rostos que se curvam.
Apenas brilha bruxuleia ondeia
indefectível próxima dourada.
Tudo é incerto ou falso ou violento: brilha.
Tudo é terror vaidade orgulho teimosia: brilha.
Tudo é pensamento realidade sensação saber: brilha.
Tudo é treva ou claridade contra a mesma treva: brilha.
Desde sempre ou desde nunca para sempre ou não:
brilha.
Uma pequenina luz bruxuleante e muda
como a exactidão como a firmeza
como a justiça.
Apenas como elas.
Mas brilha.
Não na distância. Aqui
no meio de nós.
Brilha.
Jorge de Sena
1919-1978

Antologia Poética
Jorge de Sena; edição de Jorge Fazenda Lourenço
Guimarães Editores

Jorge de Sena nasceu em Lisboa e morreu em Santa Bárbara, Califórnia, onde era professor. Uma biografia pode ser lida na Wikipédia. No blogue As Tormentas também podem ser lidos poemas e biografia. Livros fundamentais deste autor, nomeadamente Sinais de Fogo, podem ser requisitados na Biblioteca.

2011-07-06

dizer poesia: José Régio



Desde que tudo me cansa,
Comecei eu a viver.
Comecei a viver sem esperança...
E venha a morte quando Deus quiser.

Dantes, ou muito ou pouco,
Sempre esperara:
Às vezes, tanto, que o meu sonho louco
Voava das estrelas à mais rara;
Outras, tão pouco,
Que ninguém mais com tal se conformara.

Hoje, é que nada espero.
Para quê, esperar?
Sei que já nada é meu senão se o não tiver;
Se quero, é só enquanto apenas quero;
Só de longe, e secreto, é que inda posso amar. . .
E venha a morte quando Deus quiser.

Mas, com isto, que têm as estrelas?
Continuam brilhando, altas e belas.



José Régio
1901-1969

Poesia II
José Régio
Imprensa Nacional-Casa da Moeda

Sendo um dos mais importantes escritores portugueses do século XX, a obra de José Régio (poesia, teatro, ficção, ensaio) pode ser consultada na biblioteca. Alguns dos seus contos são muito requisitados para os contratos de leitura estabelecidos na disciplina de Português. Uma boa informação biográfica sobre o poeta pode se vista aqui. Outros sites, como este, estão disponíveis na net.