O pintor modernista Amadeo de Sousa Cardoso (1887-1918) é uma das vítimas da pneumónica. A sua biografia é ficcionada por Mário Cláudio na obra Amadeo (Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores de 1984), primeiro dos três livros que publicará sobre figuras do Norte português (além de Amadeo, Guilhermina Suggia e Rosa Ramalho) reunidos em Trilogia da mão, Dom Quixote:1993.
No excerto do romance escolhido, a doença começa a aproximar-se:
O vírus da pneumónica alastra já por Manhufe, acobertado à modorra dos pântanos, retido no hálito dos matagais, enleado nos bardos úberes de cachos, por que é esse o mês de Setembro. O alarme se dá, sobretudo, entre os ilustrados na leitura dos periódicos, titulares da terra, que no meio dos campesinos a morte é convívio de todas as horas. E o pânico em que soçobra Amadeo, nesse pronúncio da irrealização da fantasia acalentada, é opressão que se abstém de transmitir, possuído do fantasma ainda da virilidade, que só o desabafo lhe permite como fundamento da recuperação da força. Circulam as notícias pelo telégrafo, há acenos de amigos longínquos que vão tombando, intoleráveis expectativas de que decorra o tempo da incubação. A casa da Dona Ana Guedes, respeitabilíssima matrona local, vereadora e filantropa, foi já convertida em hospital. Com o máximo dos zelos se marcam talheres e roupa branca, que a seguir se escaldam em água fervente, ainda assim cheirados pelo homem que em tudo suspeita a presença minante. Fica-se pelo quarto, de gelosias cerradas, no atelier, outras vezes, com uma espátula entre os dedos, fitando a tela deserta, na mais concentrada imobilidade.
Mário Cláudio, Amadeo, Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 1984, pp.107-108
Voltamos à escola.
A biblioteca, nesta primavera que se vê das nossas janelas, está aberta. Para já para os alunos do 3.º ciclo, mas esperamos que no dia 19 tenhamos também os alunos do secundário.
Não cantes o meu nome em pleno dia
não movas os seus ásperos motivos
sob a luz dolorosa sob o som
da alegria
Não movas o meu nome sob as tuas
mãos molhadas do choro doutros dias
não retenhas as sílabas caídas
do meu nome da tua boca extinta
Não cantes o meu nome a primavera
já o ameaça hoje principia
a vida do meu nome não o cantes
com a tua alegria
Gastão Cruz, «Imagem da linguagem, 7» in «Teoria da fala», Poemas reunidos, Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1999, p.173