2023-07-28

Despedida

 



Quem fala de partir, de despedidas...
Quantas vezes parti na minha vida,
me despedi de vez de gente e de lugares
a que voltei para encontrá-los outros...
Nem contar posso. E às vezes despedir
foi só pisar com vã melancolia
as ruas de cidades onde não deixava
ninguém que me lembrasse. Às vezes foi
apenas receber por um relance vago
a imagem de um recanto ou de uma luz
iluminando nevoentos muros...
Não muitos terão tido a vida inteira
esta febre de andar por vários mundos
buscando ansioso o nada nosso e deles
que ao menos nada finge em gente e coisas...
E não terão, portanto, na memória
o tanto haver partido para longe,
para saberem que se parte sempre,
e não se volta nunca. O mesmo amor
que fiel aguarda o regressarmos não
é o mesmo já, mesmo se mais ardente
sob os cabelos que lhe são mais brancos.


Londres, 15/3/1973
Jorge de Sena, Poesia 2, edição de Jorge Fazenda Lourenço, Lisboa, Guimarães, 2015,
pp. 726-727
in https://folhadepoesia.blogspot.com/2019/07/quem-fala-de-partir-de-despedidas-jorge.html

Termino aqui, com uma fotografia do jardim da nossa biblioteca neste Verão, por enquanto temperado, e com este belo poema de Jorge de Sena 
em natureza e com mais uma leitura acordada: boas motivações para a vida.
jn