2022-10-31

#lerparaapaz, MIBE 2022 - 20

  


 

 

Na biblioteca da escola depois da guerra

 

Ao entrar sinto a cara a arder:

montes de livros, migalhas de cultura e de beleza

juncam o chão como espigas calcadas

após a passagem de um brutal furacão.

 

A poeira da guerra veio pousar nos lábios

dos homens de génio. Vozes incorruptíveis

a troar por cima do espaço e do tempo.

Mas incapazes de esmagar as botas do fantasma.

 

Apanho o livro pouco espesso furado

Por uma bala. A chaga é horrível.

Todas as folhas estão manchadas de sangue.

 

Abro. Leio. Não posso reter as lágrimas

quando o título vem dançar diante dos meus olhos:

«Os sonetos sangrentos de Hviezdoslav».

 

Julius Lenko (1941-1991), in A rosa do mundo 2001 poemas para o futuro, (dir edit. Manuel Hermínio Monteiro) Lisboa: Assírio e Alvim, 2001, pp.1547-1548

 

Nos 32 poemas que compõem Os Sonetos Sangrentos (1914), o poeta eslovaco Pavol Országh Hviezdoslav pergunta quem é o responsável pelos horrores e sofrimentos da guerra, revelando também esperança de que a humanidade aprenda a viver em paz. 

http://relvateresa.blogspot.com/2021/03/os-sonetos-sangrentos-de-hviezdoslav.html 

Concluímos com este poema de um poeta eslovaco a nossa proposta de textos para a paz. Afinal , a maioria fala da guerra. Sim, é a guerra que nos faz falar da paz.

2022-10-28

#lerparaa paz MIBE 2022 -19

 



Ruínas


A lua quebra os seus espelhos nas ruínas enquanto Beirute faz muletas de sangue e cinzas e coxeia com elas.

É verdade. O céu tem correntes à volta dos pés, e as estrelas têm adagas presas na cintura.

O dia esfrega os olhos sem acreditar no que vê.

Chora, Beirute, limpa as tuas lágrimas com o lenço do horizonte. Escreveste de novo ao céu, mas estavas errada e agora os teus erros escrevem-te.

Não tens outro alfabeto?

 

Adonis, O arco-íris do instante antologia poética, Lisboa: Publicações Dom Quixote, 2016, p .95

2022-10-27

#lerparaapaz, MIBE 2022- 18

 


Recitativo do requiem para os caídos da Europa (1917)

 

Quero queixar-me dos homens no exílio do seu tempo;

Queixar-me das mulheres de coração jubilante, agora a gritar num lamento;

Quero acumular e repetir todos os queixumes

De viúvas apertando-se em corpetes impacientes, no crepitar de lumes;

Ouço crianças de loira voz que antes de irem para a cama perguntam por Deus-                                                                                                                              -Pai;

Em todos os frisos vejo retratos com hera, sorrindo fiéis ao tempo que já lá vai;

De todas as janelas ardem para pétreos longes olhares de raparigas abandonadas;

Em todos os jardins se cultivam sécias, como se já as campas tivessem de ser                                                                                                                     [preparadas;

Em todas as ruas os carros se movem mais lentos, como num enterro;

Em todas as cidades tocam mais forte os sinos, porque há sempre mais um que às                                                                                [balas tombou em qualquer cerro;

Em todos os corações há um lamento

E em cada dia o oiço mais violento.

 

Iwan Goll, «Recitativo do requiem para os caídos da Europa (1917)», Expressionismo alemão, antologia poética, (org. João Barrento), Lisboa: Ática [sd, 1976], p.83

2022-10-26

#lerparaapaz MIBE 2022 -17


 

O carro de assalto e o camião como os animais pesados e corpulentos da selva, búfalos e rinocerontes. A metralhadora como um mexerico que ceifa muitas vidas de uma só vez? Ou a espingarda, a  arma calma e pessoal, a extensão do poder do homem. Não poderão estar todos relacionados?

E, pelo contrário, em combate, os homens estão mais próximos da natureza das máquinas que da natureza humana. Uma tese plausível e aceitável. Os combates são organizações de milhares de homens-máquinas a deslocarem-se com movimentos preordenados através de um campo, a suarem como um radiador ao sol, a estremecerem e a tornarem-se rígidos como um pedaço de metal à chuva. Já não nos encontramos assim tão distantes das máquinas. Consigo vislumbrar isso no meu próprio pensamento. Já deixámos de adicionar maçãs e cavalos. Uma máquina vale tantos homens. A marinha levou isso a um requinte maior do que o exército. Os países cujos líderes aspiram a igualar-se a Deus fazem a apoteose da máquina.

 

Norman Mailer, Os nus e os mortos (1948),Lisboa: Publicações Dom Quixote, 2008, p.561

2022-10-25

apresentar a biblioteca

 

 


Em Mês Internacional das Bibliotecas Escolares, concluímos hoje a apresentação da biblioteca às 23 turmas do 8.º e do 10.º ano que iniciaram o seu novo ciclo de estudos da nossa escola. Esperamos que os nossos novos alunos tenham ficado com uma ideia deste mundo que é a biblioteca da nossa escola. Agora, é praticar.

Erradicar a pobreza - propostas

 

 

in https://www.facebook.com/oikos.cd/

 

     Resumo da discussão da turma do 11°AV1 na disciplina de Filosofia

            Formas de erradicar a pobreza

·         17 objetivos que os 193 governos do mundo assumiram na assembleia geral da ONU

·         O principal objetivo é criar um mundo onde não há pobreza e fome

·         O desenvolvimento humano está pendente das condições de cada país à sua sobrevivência

·         A concretização destes objetivos depende de: - enquanto cidadãos do mundo devemos adaptar os nossos hábitos para um melhor mundo

-diminuir a quantidade de desperdício e o consumo excessivo

-devemos adotar hábitos sustentáveis como a reciclagem e os recursos naturais

·         O ser humano é egoísta e ganancioso por natureza pois já que ainda não descobriu e resolveu todos os problemas do seu mundo quer descobrir e explorar outros mundos

·         Devemos afirmar pequenas ações e gestos no nosso dia à dia para lutar por um mundo sem desigualdade:

-lutar por um mundo sem pobreza

-lutar por um mundo onde todos têm acesso a uma alimentação equilibrada, acesso comum à saúde e educação

-lutar por um mundo onde não existe discriminação de género como por exemplo, a discriminação da mulher e a violência da mulher

·         Tudo isto depende da determinação, foco, força de vontade, persistência e resiliência da população.

·         Estas mudanças e atos começam na nossa vida quotidiana, na nossa escola, família e sociedade, como também nos governos (incentivar ao uso dos transportes públicos)

·         Para tudo isto devemos estar atentos ao mundo que nos rodeia, pois não dando valor às condições que nos são proporcionadas não tomamos consciência dos indivíduos que necessitam de ajuda para a sua sobrevivência

·         Devemos também tomar consciência e agir contra os problemas que se fazem sentir na nossa sociedade:

-a seca extrema em Portugal e na europa

-a pobreza nos países não desenvolvidos

-a violência doméstica sentida na atualidade

-os fenómenos meteorológicos extremos sentidos por todo o mundo

-degradação e destruição dos habitats e recursos naturais

-a intensa caça e extinção em massa de espécies animais essenciais à fauna e flora de cada país

-violência e discriminação religiosa

- a escravatura e trabalho infantojuvenil nas fábricas e produções de produtos considerados luxuosos e essenciais

·         A concretização dos objetivos definidos na assembleia geral da ONU está totalmente dependente da ação e mentalidade da sociedade atual, sendo necessário instruir e alertar para o início da luta contra os problemas do mundo atual.

Erradicar a pobreza - propostas

 

17 de outubro: Dia para a erradicação da pobreza: as conclusões e propostas do 10CT3

As conclusões e propostas do 10 CT3 


 


 

#lerparaapaz MIBE 2022 - 16

 


Parecia que a guerra desalojara a Stalinegrado antiga. Era fácil imaginar como os oficiais alemães saíam das caves, como o marechal de campo andava ao longo destas paredes cobertas de fuligem e as sentinelas se endireitavam à vista dele. Mas seria possível imaginar que foi ali que Aleksandra Vladimirovna comprou fazenda para um sobretudo, o relógio que dera a Marússia no seu dia de anos, que viera ali com Serioja e, na secção de desporto, no primeiro andar, lhe comprara patins?

Provavelmente, é a mesma impressão estranha que têm aqueles que vão visitar Malákhov Kurgan, Verdun, o campo de Borodinó - ver criança, mulheres que lavam a roupa, uma carroça carregada de feno, um velho com um ancinho... Aqui, onde são as vinhas, andaram colunas de poilus, andaram camiões cobertos de lona; lá, onde agora é uma isbá, pasta o gado magro kolkhoziano e há macieiras, passara a cavalaria de Murat; deste sítio, Kutúzov, sentado na poltrona, com um gesto da mão senil, lançava ao ataque a infantaria russa. Em cima do kurgan, onde as galinhas e as cabras poeirentas estão a pastar nas ervas entre as pedras, o almirante Nakhímov esteve parado, daqui voaram as bombas luminosas descritas por Tolstói, aqui os feridos gritavam, as balas inglesas assobiavam.

Vassili Grossman, Vida e destino (c.1961), Alfragide: Publicações Dom Quixote, 2011,  pp.844-845

2022-10-24

#lerparaapaz, MIBE 2022 - 15

 


A rosa de Hiroshima

 

Pensem nas crianças

Mudas telepáticas

Pensem nas meninas

Cegas inexatas

Pensem nas mulheres

Rotas alteradas

Pensem nas feridas

Como rosas cálidas

Mas oh não se esqueçam

Da rosa da rosa

Da rosa de Hiroshima

A rosa hereditária

A rosa radioativa

Estúpida e inválida

A rosa sem cirrose

A anti-rosa atómica

Sem cor sem perfume

Sem rosa sem nada.

 

Vinicius de Morais, Antologia poética, Lisboa: Publicações Dom Quixote, 2001, p.299

2022-10-21

#lerparaapaz MIBE 2022 -14

 


Ele rodava a cadeira, frente para trás. De quando em enquanto se escutavam tiros, rajadas de metralhadora.Já nem nos alarmávamos. Lá fora havia o matraquear da morte, lamentos de vidas que se apagavam. Para nós, porém, aquele ruído, era já parte da paisagem. Ficava, contudo, um amargo escorrendo naquelas paredes. Nosso assunto se engasgou. Comentei sobre a eternidade que demorava a guerra. Assane discordou:

- Nem isto guerra nenhuma não é. isto é alguma coisa que ainda não tem nome.

Se explicou: antes fosse uma guerra a sério. Se assim fosse teria feito crescer o exército. Mas uma guerra-fantasma faz crescer um exército fantasma, salteado, desnorteado, temido por todos e mandado por ninguém. E nós próprios, indiscriminadas vítimas, nos íamos convertendo em fantasmas.

 - No fundo da latrina não pode haver guerra limpa.

 

Mia Couto, Terra sonâmbula, Lisboa, Caminho, 1998, p.121

2022-10-20

#lerparaapaz MIBE 22- 13


 

Um dia, chegou um homem à aldeia, ferido, com a roupa em farrapos sanguinolentos. Suplicou para o esconderem. Eles nem tiveram tempo para pensar  no que fazer. Apareceram soldados, quatro ao todo, pegaram no homem, empurraram-no para uma árvore, uma rajada atordoou os pássaros e as gentes. Enterrem-no, mandaram. E foram embora pelo caminho de onde vieram, sem mesmo beberem água. Enterraram o homem, iam fazer mais como então? Durante dias lamentaram o morto, enterrado sem xinguilamento nem choro de familiares, sem bebida deitada nos caminhos para orientar o espírito. Muitas teorias foram criadas sobre a origem do finado e as causas da sua morte, todas sem comprovação. E temiam que o espírito injustiçado rondasse perto e eles pagassem pelo que não fizeram. Tantas outras coisas sucederam entretanto que foram esquecendo, mesmo o local da sepultura. A Muari não esqueceu, por vezes murmurava, podia ter sido um dos meus filhos.

 Pepetela, Parábola do cágado velho (1997), Alfragide: Publicações Dom Quixote, 2016, p.37

2022-10-19

#lerparaapaz MIBE 2022 12

 



Dembos

 

Monólogo e explicação

 

Mas não puxei atrás a culatra,

não limpei o óleo do cano,

dizem que a guerra mata: a minha

desfez-me logo à chegada.

 

Não houve pois cercos, balas

que demovessem este forçado.

Viram-no à mesa com grandes livros,

com grandes copos, grandes mãos aterradas.

 

Viram-no mijar à noite nas tábuas

ou nas poucas ervas meio rapadas.

Olhar os morros, como se entendesse

o seu torpor de terra plácida.

 

Folheando uns papéis que sobraram

lembra-se agora de haver muito frio.

Dizem que a guerra passa: esta minha

passou-me para os ossos e não sai.

 

Fernando Assis Pacheco, «Catalabanza, Quilolo e volta» (1972) A Musa irregular, Lisboa: Assírio e Alvim, 2006, p.51

2022-10-18

#lerparaapaz MIBE 2022 -11

 


Em Mangando e Marimbanguengo, vi a miséria e a maldade da guerra, a inutilidade da guerra nos olhos de pássaros feridos dos militares, no seu desencorajamento e no seu abandono, o alferes em calções espojado pela mesa, cães vadios a lamberem restos na parada, a bandeira pendente do seu mastro idêntica a um pénis sem força, vi homens de vinte anos sentados à sombra, em silêncio, como os velhos nos parques, e disse ao furriel miliciano, que desinfectava o joelho com tintura, É impossível que um dia destes não tenhamos uma merdósia qualquer, porque, sabe como é, quando homens de vinte anos se sentam assim à sombra, num tão completo desamparo, algo de inesperado, e estranho, e trágico acontece sempre, até que me vieram informar do rádio Um tipo deu um tiro em Mangando, e eu corri para o carro onde a escolta me aguardava  a aprontar-se ainda, e seguimos aos saltos para o norte pela picada que a chuva destruíra.

 

António Lobo Antunes, Os cus de Judas, Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1994, p. 199

2022-10-17

#lerparaapaz MIBE 2022 -10

 


Metralhadoras cantam

 

Acenderam-se as armas pela noite dentro.

Quem rebenta? Quem morre? Quem vive? Quem berra?

Há um vento de lamentos nos lamentos do vento.

Metralhadoras cantam a canção da guerra.

 

Cantam granadas a canção da morte.

E há uma rosa de sangue à flor da terra.

Morrer ou não morrer é uma questão de sorte.

Metralhadoras cantam a canção da guerra.

 

Cantam bazucas e morteiros e estilhaços

cantam esta canção do aço que não erra

no espaço do seu fogo o espaço entre dois braços.

Cantam  metralhadoras a canção da guerra.

 

Há um tiro que parte. Há um corpo que tomba.

Nesta boca fechada há um morto que berra.

Quem estoira no meu peito: o coração? Uma bomba?

Metralhadoras cantam a canção da guerra.

 

Todo o tempo é uma batalha. Ataque. Fuga.

Fuga. Ataque. Silêncio. Um silêncio que aterra.

Que marca o rosto com seu peso ruga a ruga.

Um silêncio que canta na canção da guerra.

 

Mina.emboscada. Pó. Pólvora. Sangue. Fogo.

Acerta não acerta? Erra não erra?

Perdeu todo o sentido dizer-se até logo.

Metralhadoras cantam a canção da guerra.

 

Cada segundo pode ser o último segundo.

Como enterrar os mortos que a memória desenterra?

Há um poço tão fundo tão fundo tão fundo.

Metralhadoras cantam a canção da guerra.

 

Há um soldado que grita eu não quero morrer.

E o sangue corre gota a gota sobre a terra.

Vai morrer a gritar eu não quero morrer.

Metralhadoras cantam a canção da guerra.

 

Houve um que se deitou e disse: Até amanhã.

Mas amanhã é o dia que se enterra

o soldado que disse: Até amanhã.

Metralhadoras cantam a canção da guerra.

 

E um jipe corre pela noite dentro.

Avança não avança? Emperra não emperra?

Passam balas de chumbo nas balas do vento.

Metralhadoras cantam a canção da guerra.

 

E há duzentos quilómetros de morte

em duzentos quilómetros de terra.

Neste caminho de Luanda para o Norte

metralhadoras cantam a canção da guerra.

 

Manuel Alegre,  O canto e as armas (1967), Poesia, primeiro volume (1960-90), Lisboa: Publicações Dom Quixote, 2009, pp. 126-128

Erradicar a pobreza

Hoje, 17 de outubro, comemoramos o Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza como um dos meios para lembrar e atuar para a concretização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), aprovados por unanimidade na Assembleia Geral da ONU, a concluir até 2030. Na Secundária, convidámos os docentes que têm aulas no segundo bloco, da manhã ou da tarde, a promover, nas suas turmas, um debate sobre o tema, que pode ter por base de reflexão o Manifesto contra a Pobreza e/ou uma das 20 imagens “Pobreza 100 motivos para agir” propostos pela Oikos.
 
 
 
Alunos, alguns com t-shirts brancas, realizaram cartazes sobre o tema a partir de ferramentas tecnológicas como o Canva.